Primeiramente, recapitulamos o que foi debatido no encontro anterior, articulando a discussão teórica, proposta nos textos , com as imagens, em relação ao papel/função do professor de Educação Física na Educação Infantil. O diálogo com os demais profissionais da instituição é um caminho para o desenvolvimento de uma prática docente de qualidade, construindo um vínculo entre os saberes, buscando a totalidade do trabalho pedagógico, pautado pelas necessidades, interesses e demandas das crianças.
As práticas corporais devem ser trabalhadas pela instituição de uma forma integrada, e a Educação Física tem grande importância neste processo educacional, contribuindo principalmente para a construção e ampliação do repertório de experiências corporais das crianças.
Em seguida, assistimos as imagens de uma aula da professora Inelve , e os professores da rede destacaram a diversidade de brincadeiras e materiais, organizados de uma maneira que consideramos como “o olhar da Educação Física”, de alguém atento às experiências do corpo, em especial quando em movimento.
Surgiu então, uma temática interessante: como ampliar o repertório de movimentos das crianças, usando os mesmos materiais e espaços? Apesar da ausência da professora Inelve no encontro, supomos que a proposta tem sempre um tema diferente, provavelmente dispondo os materiais de outra forma, com outras brincadeiras. Ainda sobre este assunto, duas professoras destacaram a capacidade que as crianças possuem para recriar as brincadeiras, buscando novos desafios.
O corpo é vivenciado muitas vezes como a própria brincadeira e também como um grande desafio, na tentativa de superar limites, experimentar novas sensações e outras possibilidades de se movimentar, sendo um dos elementos que constitui a cultura infantil, manifestando-se com uma diversidade de significados, linguagens e emoções. A presença da Educação Física na pré-escola contribui no desenvolvimento do se-movimentar (Kunz, 1991), onde a criança vivencia as três dimensões do movimento, o sentir, pensar e o agir, (Kunz, 1991) sendo de grande relevância para a formação.
A questão do tempo das práticas de Educação Física foi outro elemento abordado a partir das imagens, aliás, essa discussão acompanha os projetos de formação continuada desde 2002, e o atual grupo argumentou que a temporalidade da intervenção deve ser suficientemente extensa para as crianças vivenciarem o que é proposto, adequando o tempo das aulas aos objetivos da formação .
Outra temática relacionada às imagens foi a presença da professora de sala durante as intervenções da Educação Física, e a resposta dos professores da rede foi que essa participação varia, é mais pessoal, pois alguns participam sempre e ativamente, muitas vezes não sendo possível evidenciar quem está conduzindo a aula (como relatado por uma professora), e se outros apenas acompanham ou não participam. Outra resposta foi que esta relação, este envolvimento, é construído, com o professor de Educação Física assumindo um papel de orientador destas professoras, pois na maioria das vezes, elas têm um outro olhar sobre a prática, mais preocupadas com a segurança das crianças, e não enxergam a importância e a real contribuição que a Educação Física pode dar para a formação dos pequenininhos. É possível que com esse diálogo, elas (professoras de sala) possam compreender melhor e ver sentido no que está sendo proposto.
A prática pedagógica deve propiciar momentos prazerosos e formadores, mas alertamos que não pode se esgotar no que as crianças “gostam” e querem de forma casual ou imediata, mas trazendo constantemente novos elementos que contribuam para ampliar o repertório de movimentos, sensações, emoções, situações e gostos. Para tal, a técnica se torna um elemento fundamental e libertador, na medida em que as crianças aprendem a técnica de um determinado movimento, elas absorvem também os perigos oferecidos e as outras possibilidades existentes deste mesmo movimento.
Apesar da importância da técnica, ela não deve ser a finalidade da proposta pedagógica, e sim um elemento para potencializar o prazer e o alcance de novas possibilidades de movimento, possibilitando que as crianças se sintam mais seguras na execução de um gesto durante a brincadeira e também dando subsídios para elas criarem maneiras próprias de se movimentar a partir da técnica básica.
Para que as técnicas corporais sejam compreendidas pelas crianças, é preciso dar um sentido que as mobilize a aprenderem, e que deve estar intimamente ligado ao imaginário. Aqui se coloca um importante papel do professor de Educação Física na Educação Infantil, encontrar o estado de empatia entre os objetivos da aula e a linguagem multidimensional da criança.
Talvez, esta seja a tarefa mais difícil do professor de Educação Física, mas propomos que, por meio da observação atenta do cotidiano da instituição, a reflexão crítica da própria prática pedagógica e a pesquisa , essa dificuldade possa ser superada para que as crianças vivenciem experiências realmente formadoras no processo educacional.
Dialogando com essa dificuldade, surge o tema da formação acadêmica da Educação Física, com um déficit no ensino dos conteúdos clássicos, entre eles o das modalidades esportivas, sendo este muitas vezes um fator limitante para a ampliação do repertório de movimentos corporais das crianças, com professores repetindo atividades baseadas em suas experiências pessoais, usualmente calcadas no princípio esportivo, privando os pequeninos de experimentarem uma gama vasta e importante de movimentos.
Já finalizando o encontro, foi brevemente relatada uma experiência no ensino da capoeira, conteúdo com o qual vários têm dificuldades por conta de nossa formação fragmentada na licenciatura em Educação Física. Um momento interessante do que foi relatado diz respeito ao trânsito de trazer para a instituição os conhecimentos da capoeira (ou de outras práticas corporais), na forma de oficinas, por exemplo, e, ao mesmo tempo, buscar esses conhecimentos ao levar a si e as crianças para os locais onde a capoeira é praticada.
Esta forma dinâmica de tratar o conhecimento é muito produtiva, pois o professor também se forma nestas experiências, ampliando o repertório pessoal de conhecimento, algo que poderá desdobrar em suas intervenções.
1 Vaz, F. Alexandre. Aspectos, contradições e mal-entendidos da educação do corpo e a infância.Sayão, T. Deborah. A construção de identidades e papéis de gênero na infância: articulando temas para pensar o trabalho pedagógico da Educação Física na Educação Infantil.
2 As imagens foram feitas na creche Nossa Senhora Aparecida, sendo documentada uma proposta de interação entre 3 turmas de diferentes idades, planejada pela professora de Educação Física e articulada com toda a instituição.
3 Ver: Sayão, Deborah T. O Fazer pedagógico do professor/a de Educação Física e Cardoso, Carlos L. Emergência Humana, Dimensões da Natureza e Corporeidade: sobre as atuais condições espaço-temporais do se-movimentar.
4 Ver: Adorno, Theodor. Educação após Auschwitz e Vaz, Alexandre F. Técnica, esporte e rendimento.
5 Ver: Vaz, Alexandre F. Aprender a produzir e mediar conhecimentos: um olhar sobre a prática de ensino de Educação Física. Motrivivência, 1999.
Referências
KUNZ, Elenor. Educação Física: Ensino e Mudança. Ijuí: Ed. Unijuí, 1991.
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